Especialistas vêem com preocupação a flexibilização das atividades na cidade, que já está em sua última fase, num momento em que os casos de Covid-19 não apresentam queda e, ao mesmo tempo em que o número de leitos de UTI para os pacientes específicos de coronavírus apresentam redução. Dados de um relatório elaborado pelo Comitê Científico da Prefeitura aponta para uma perda significativa do número de leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) para pacientes de Covid-19 no Rio, fazendo com que o tempo de espera da transferência para um hospital público seja de 23 h.
—Na realidade a gente teve uma redução de leitos na cidade do Rio de Janeiro e uma manutenção no número de casos e isso aí vai ter impacto. O número de casos está mais ou menos estável nas últimas semanas, mas teve fechamento dos hospitais de campanha. Então reduziu o número de leitos. E, com isso você tem uma dificuldade maior de transferir os doentes das unidades básicas para as unidades de terapia intensiva. A única forma (de resolver) é aumentar a oferta (de leitos). Diminuir o número de casos vai ser difícil, com as atividades voltando ao normal. Até jogo de futebol agora vai voltar a ter público. Ou você aumenta a oferta de leitos ou o número de casos não vai cair —aponta o infectologista Alberto Chebabo, para quem as atividades estão sendo retomadas de forma aleatória e sem nenhum critério.
Os dados do relatório do comitê científico mostram que na última sexta-feira havia 520 leitos operacionais de um total de 950 cadastrados, o que corresponde a um redução de 26% dos leitos operacionais em cerca de 30 dias. Isso fez com que o tempo médio de espera para transferência que era de 8 h saltasse para 23 h.
Em 1º de agosto, considerando apenas os leitos específicos para UTI em todas as esferas administrativas, incluindo o Hospital São José, em Duque de Caxias, havia 659 leitos operacionais de um total de 1.040 cadastrados. Já em 1º de setembro eram 581 leitos operacionais no universo de 940 leitos cadastrados.
O sanitarista Roberto Dal Poz, professor do Instituto de Medicina Social da UERJ, também critica a forma como está sendo feita a flexibilização, mas para ele o problema maior no Rio é a falta de um trabalho coordenado no enfrentamento da Covid-19. Segundo ele, desde o início da pandemia faltou integração entre os diversos sistemas de saúde.
— Saúde pública é informação, coordenação e controle dos casos e não estão fazendo isso — criticou.
O fechamento dos hospitais de campanha é apontado como uma das causas para essa diminuição de leitos disponíveis pelo médico Sylvio Provenzano, chefe do serviço de clínica médica do Hospital dos Servidores do Estado. Mas , ele credita ainda o problema ao aumento de casos, inclusive de pacientes de outras cidades que procuram atendimento na rede municipal do Rio. Além na necessidade de reabertura de novos leitos, o especialista recomenda que a população se conscientize da necessidade de tomar com a precaução para evitar o contágio.
—É preciso que as pessoas entendam que a doença não foi embora. Ela está aí e a gente precisa tomar os cuidados de proteção individual. Cada um tem que ter cuidados como lavar as mãos, usar máscara e evitar aglomerações. É preciso que a maior parte da população se convença de que esse comportamento é o que vai ser exigido por um certo tempo —afirmou Provenzano.
Na semana passada, o prefeito Marcelo Crivella já havia informado que a prefeitura estava tentando firmar um convênio com o governo federal para reabrir 95 vagas de UTI na rede municipal. Segundo a prefeitura, cada leito de UTI custa cerca de R$ 4 mil. A intenção é fazer um contrato de 60 dias, que teria um custo total em torno de R$ 24 milhões. Neste segunda-feira, o subsecretário municipal de Saúde, Jorge Darze informou que o município está buscando junto ao Ministério da Saúde a habilitação desses leitos, que seriam abertos no Hospital de Campanha do Riocentro e no de Acari.
—A prefeitura já autorizou a ampliação de 95 leitos, que vai dar uma tranquilidade para a rede. São leitos de terapia intensiva. Já buscamos no Ministério da Saúde a habilitação desses leitos, para que o ministério possa ressarcir essas despesas ao município do Rio de Janeiro- explicou Darze. — Perdemos quatro pontos de referência para atendimento de pacientes com Covid (com o fechamento dos hospitais de campanha) e, além disso, a rede privada tratou de imediatamente acabar com todas as enfermarias destinadas ao Covid, acrescentou.
Sobre a flexibilização, Darze disse que o município está fazendo o acompanhamento e não descarta nenhuma hipótese, inclusive recuos. Ele exemplifica citando medidas punitivas mais duras para bares, como a alteração nos horários de funcionamento e até mesmo a possibilidade de fechamento em caso de desrespeito às normas da prefeitura.
—São medidas que estão sendo tomadas proporcionalmente ao controle da doença. Se a situação das praias e dos bares não for resolvida e, nós já sabemos que tem um impacto grande na ampliação do número de contaminados. é claro que a gente vai ter que radicalizar com essas duas áreas — prometeu.